Um Novo Amanhecer Cíntia e Alberto Mora Alves
Capítulo 1
Cíntia acordou atrasada, tomou um banho rápido e,
como de costume, tomou seu café e saiu apressadamente.
Cíntia era mulher com seus 28 anos, aparentava bem
menos, pelo menos era o que todos diziam, de estatura baixa,
cabelos pretos, olhos castanhos claros e uma alegria sem
tamanho. Não se entregava ao desânimo, viver para ela era
uma luta constante; acreditava que as pessoas cresciam à
medida que enfrentavam os obstáculos. Chamava muito a
atenção pelos seus cabelos longos, um olhar muito distante,
parecia que estava sempre sonhando com alguém, não era
nada fácil, mas, apesar dos pesares, era a vida que queria ter.
Aquele dia prometia, havia trânsito para todos os
lados, ela já não sabia mais a que horas conseguiria chegar
ao trabalho.
Era um dia ensolarado, em uma cidade que já estava
se tornando pequena, pelo número de habitantes novos
que apareciam a cada ano.
“Como é bonito ver a Avenida Teotônio Vilela de
manhã, toda arborizada. Apesar do trânsito, é um convite
à natureza”. – pensou Cíntia.
Quando enfim chegou ao trabalho estacionou seu
carro rapidamente e não percebeu que Alberto a esperava.
Ele se aproximou e disse todo envergonhado:
– Bom dia, Cíntia, já estava ansioso, pensei que não
viesse mais hoje. – disse ele timidamente.
– Não foi nada fácil chegar aqui hoje, mas, enfim,
aqui estou pronta para começar.
– Então vamos, estou com algumas ideias e gostaria
muito de saber sua opinião.
Alberto era um homem com seus 34 anos, alto, tinha
1,83m de altura, cabelos pretos e um sorriso cativante.
Ambos trabalhavam num hospital da região; hospital
este que atendia principalmente casos de pacientes
com câncer.
Alberto morava com a mãe, que se chamava Marli e
mais duas irmãs – Vera e Thaís. Tinha uma paixão secreta
por Cíntia, mas nunca ousou se declarar, pois tinha medo
de não ser correspondido. Nas horas vagas dedicava-se a
um trabalho voluntário junto à comunidade.
Sabia da vida difícil daquelas pessoas, suas necessidades,
a grana curta e encontrou justamente em Cíntia o
mesmo desejo de ajudar as pessoas carentes, – carentes de
afeto e respeito – alguém que acreditasse em seus sonhos,
mostrasse a elas como elas eram importantes e que podiam
fazer a diferença.
Quando chegaram à sala de Cíntia começaram a colocar
o trabalho em dia e decidir como iriam formar um
grupo de apoio aos pacientes.
Cíntia então disse a Alberto:
– Alberto, temos um trabalho tão bonito em nossas
mãos, sei que não podemos consertar o mundo, resolver
todos os problemas da humanidade, mas uma pequena parcela
da nossa dedicação fará uma grande diferença.
– É verdade Cíntia, às vezes achamos que não temos
como ajudar, mas na verdade temos tantas maneiras de
sermos úteis aos que necessitam. Seja uma palavra de conforto,
uma visita ou então enviarmos pensamentos positivos,
pois são eles que nos levam a seguir em frente.
Ficaram mais algum tempo analisando ficha por ficha.
No total seriam 5 pessoas que não tinham a quem
recorrer e que precisavam muito de ajuda. Depois saíram
para almoçar à tarde e deram continuidade ao trabalho.
O dia já estava terminando, logo mais cada um voltaria
para suas casas.
Cíntia, sempre bem disposta, resolveu que iria assistir
a um filme depois do expediente, assim deixaria de lado
toda tensão do dia. Alberto decidiu ir para casa, pois sua
mãe o aguardava para juntos irem fazer compras.
A mãe de Alberto, Dona Marli, era uma mulher muito
dependente do filho, ficara viúva há algum tempo, então
grande parte dos problemas contava sempre com a ajuda dele.
Já as irmãs de Alberto, Vera e Thaís, estudavam e ajudavam
nos afazeres da casa. Vera era uma moça muito bonita,
cabelos longos, dentes perfeitos, assim como os da irmã.
Thaís era um pouco mais alta que Vera e mais nova, as duas
eram inseparáveis, estudavam de manhã e faziam curso de
informática no período da tarde. Na volta ajudavam a mãe.
Mais um dia que se inicia e para Cíntia era uma alegria
acordar e saber que logo mais estaria perto de Alberto.
Ele nem desconfiava, mas ela era muito apaixonada por
ele, e gostava do seu jeito sério – era o tipo de rapaz que
toda mulher sonhava.
Ao encontrar Alberto pelo corredor, sentiu seu coração
disparar, mas não podia dar sinais do que sentia, afinal
eram tão amigos.
– Bom dia, Alberto, como está? Tudo bem?
– Estou bem, um pouco cansado, cheguei tarde, fui
ao supermercado com minha mãe e na volta passei na sede
da comunidade, queria saber como andavam as coisas por
lá. Como você sabe, estamos preparando um grande baile
para arrecadar fundos para construir a creche tão sonhada.
– Tomara que dê tudo certo, pois a creche vai ajudar
muito as mães que precisam trabalhar, elas ficarão mais tranquilas
sabendo que seus filhos estão sendo bem cuidados.
– É verdade, – disse Alberto, mas voltando ao trabalho
– estava pensando em abrirmos um espaço para esses
pacientes que não têm família, com toda estrutura, alimentações,
acomodações e até mesmo terapia ocupacional.
– Isso é um sonho que tenho há muito tempo, até já
conversei com alguns lojistas e empresários que se propuseram
a me ajudar financeiramente se o projeto sair do papel.
– Puxa que bom sempre poder contar com você, Cíntia,
você tem sido uma pessoa cada vez mais importante
em minha vida.
A conversa seguia tranquilamente, nenhum deles tinha
coragem de falar dos seus sentimentos, nem viram o
tempo passar.
Capítulo 2
Depois de algumas semanas chegou o grande dia do
baile. Alberto acordou cedo naquele sábado, tomou seu café
com a família e despediu-se da mãe com um jeito carinhoso:
– Mãe, já estou de saída, mas não se preocupe; logo
mais estarei de volta. – beijou sua mãe e saiu.
Estava uma linda manhã, início de primavera, as flores
enfeitavam as casas, não tinha como não reparar na
beleza que a natureza proporcionava.
Quando chegou ao bairro da comunidade, comunidade
esta que se chamava “Arco-íris”, já estavam todos
trabalhando. Ia ser uma festa e tanto.
Todos os comerciantes da região fizeram questão de
participar, e ajudaram no que podiam.
O salão era enorme, havia um palco muito grande, a
iluminação e o som já estavam montados. Todos os moradores
do bairro foram convidados, o ingresso sairia a um
preço bem em conta, também montaram várias barracas
com guloseimas; parte do dinheiro arrecadado seria para
construção da creche.
Depois de tudo organizado, Alberto voltou para casa,
pois queria tomar um banho, se preparar. Sabia que mais
tarde encontraria Cíntia no baile.
Vera e Thaís também foram ao baile com o irmão. A mãe
preferiu ficar em casa, não queria saber de barulho até tarde.
Dona Marli não se conformava com a ausência dos
filhos, mas fazer o que? Se ela demonstrasse que não estava
contente, talvez eles fossem embora, viver a vida deles sozinhos,
pois já eram adultos.
Estava uma noite muito agradável, o baile estava animado,
Cíntia e Alberto ficaram o tempo todo juntos, dançando
e conversando. Como já estava de madrugada, ela
resolveu ir embora, e Alberto acompanhou-a até o carro,
deu um beijo em seu rosto e agradeceu pela noite agradável
que passaram juntos.
Ela quase se declarou, olhou bem em seus olhos, sentiu
um desejo enorme de beijá-lo, mas ficou com receio.
Quando Cíntia saiu, Alberto mais uma vez se culpou por
ser tão inseguro na presença dela.
Cíntia chegou à sua casa, e sua mãe ainda estava acordada,
não conseguira dormir naquela noite. Estava um tanto
abatida, já não se sentia bem há dias.
Raquel, mulher sofrida, separou-se do marido ainda
quando a filha era pequena, não tinha mais nem
contato com ele.
Então Cíntia passou a ser a razão principal de sua
vida. Nada na vida a faria se separar de Cíntia, e, por isso,
preferia que a filha nunca se casasse. Quando soube da
paixão de Cíntia por Alberto, ficou um tanto preocupada,
pois não queria que a filha se envolvesse com ninguém. –
Na cabeça dela isso só serviria para afastá-la.
Cíntia entrou em casa, jogou os sapatos num canto
qualquer, se jogou no sofá, estava cansada demais, “mas
mesmo assim tinha valido a pena” – pensou Cíntia. Foi
então que Raquel apareceu na sala, Cíntia quase deu um
pulo do sofá, tamanho foi o susto que a sua mãe lhe deu.
– Mãe, acordada a essa hora? Que susto!
– Oi, filha, estou sem sono; passei a noite acordada,
sinto muito a sua falta. Quando não está em casa, fico desnorteada,
não sei nem o que fazer.
– A senhora não pode ficar assim, mamãe, vai acabar
adoecendo.
– Minha filha, eu tenho tanto medo que um dia você
vá embora e me deixe sozinha nesta casa, eu preciso muito
de você, filha.
– Não se preocupe, mamãe, aonde eu for levarei você
comigo, afinal a senhora sempre foi meu porto seguro. Se não
me casei até hoje foi uma opção minha. Como a senhora sabe,
amo Alberto, mas em primeiro lugar vem a senhora.
Sua mãe ficou mais tranquila ao ouvir aquelas palavras.
Passados uns seis meses, depois daquele baile e mais
alguns eventos, conseguiram arrecadar o dinheiro para construção
da creche; a prefeitura fez a doação do terreno.
E foi numa tarde de sábado que Cíntia e Alberto
foram para inauguração da creche, todos da comunidade
estavam presentes, as crianças brincaram no parque e ganharam
algodão doce. Foi tudo muito simples, as mães estavam
felizes, não cansavam de agradecer aos dois pela iniciativa
que tiveram ao realizar um acontecimento tão importante
para aquela população carente.
Era uma creche pequena, abrigava um total de 20
crianças. As mulheres se revezavam para cuidar das crianças
e os homens auxiliavam na manutenção e pequenos
reparos do imóvel.
Recebiam doações de alimentos, calçados e roupas,
também recebiam certa quantia em dinheiro dos pequenos
empresários da região.
Certo dia Cíntia e Alberto resolveram fazer uma visita
na creche após um dia de trabalho. Perceberam, ao
chegarem na porta da creche, que havia uma criança chorando
dentro de uma caixa. Era uma menina tão miudinha
que dava medo de segurar.
Cíntia logo se apaixonou pela criança, fez todos os
trâmites necessários para ficar com a guarda dela, até que
fosse legalizada a adoção. E quanto mais o tempo passava,
mais ela se apegava à criança, sua mãe a ajudava, estava
sempre bem disposta.
Raquel voltou a sorrir, voltou a confiar mais em
Deus e acreditar que nem uma folha de uma árvore cai
antes do tempo.
Rebeca era uma menina linda, agora com 4 meses;
era tudo na vida daquelas mulheres. Uma menina forte,
com cabelos pretos, olhos pretos, que pareciam duas jabuticabas.
Tinha a pele cor de jambo, não havia quem não
olhasse para menina e não se encantasse.
Poucas vezes Rebeca ficou doente, era muito saudável,
nem parecia mais com aquele bebê que encontraram
dentro da caixa. Mas o tempo foi passando e um dia uma
mulher apareceu, queria falar com Cíntia, bateu palmas
no portão e ficou aguardando; Raquel abriu a porta, estava
com Rebeca no colo, então a moça disse:
– Boa tarde, sei que não me conhece, mas eu preciso
muito da ajuda de vocês.
– Pois então: diga o que posso fazer para ajudá-la?
Elvira começou chorar, Raquel não estava entendendo
nada, pediu que ela se acalmasse e dissesse qual
era o problema.
– Sabe, dona, eu já fiz muita besteira nesta vida, já
me prostituí, já ultrapassei todos os limites da minha dignidade
para sobreviver, até que engravidei. Não sabia
quem era o pai, me vi sozinha, minha família me abandonou,
então acabei me desesperando e deixei minha filha
na frente da creche. Agora que sei que ela está bem cuidada,
queria muito que vocês me permitissem abraçar
minha filha, é só isso que peço.
Elvira não parava de chorar, Raquel ficou chocada com
a revelação, mas, ao mesmo tempo, penalizada com aquela
jovem tão sofrida, pediu que ela entrasse e se sentasse, enquanto
iria buscar um copo d’água para que ela se acalmasse.
Tanto Cíntia como Raquel sabiam que mais dia menos
dia isso iria acabar acontecendo.
A mulher tomou a água e se acalmou, era a primeira
vez que olhava para sua filha desde o nascimento, então
Elvira disse:
– Meu Deus, como ela é linda, nem sei se mereço
estar aqui neste momento, mas confesso que estou com o
coração partido de alegria e tristeza ao mesmo tempo.
Então Elvira começou a beijar sua filha, abraçá-la e sentir
seu cheiro; lágrimas de felicidade desciam em seu rosto.
Raquel não sabia o que dizer. Deixou que Elvira transbordasse
toda sua emoção para depois fazer algumas perguntas.
Passados alguns minutos, Raquel disse:
– Me fale como é o seu nome?
– Elvira.
– Elvira, o meu nome é Raquel e sou a avó da Rebeca,
pelo menos até hoje. Gostaria que você me falasse quais
são seus planos daqui pra frente?
– Tenho que ser sincera com a senhora, dona Raquel.
– Pode me chamar de Raquel.
– Raquel, ainda não tenho condições de cuidar
da menina, o que eu peço somente é o direito de poder
acompanhar o crescimento de Rebeca. O que vocês fizeram
por mim e por minha filha, não tem preço, serei
eternamente grata.
– Então, Elvira, venha mais tarde em casa, assim
conversaremos todas juntas. Minha filha mais tarde estará
em casa, está bem? Ou se preferir fique aqui conosco,
até ela chegar.
– Posso mesmo? – perguntou Elvira.
– Claro que sim! Estou te convidando.
– Obrigada, muito obrigada mesmo!
Passaram a tarde toda juntas, conversaram. Raquel
ficou sabendo de muitas coisas da vida de Elvira e prometeu
para si mesma que conversaria com a filha, para que
juntas encontrassem uma solução para vida daquela mulher,
que agora estava tão ligada a elas também.
Quando Cíntia chegou, estranhou um pouco aquela
moça na sua casa, já que era muito difícil receberem visitas.
Raquel já foi logo falando:
– Cíntia que bom que você chegou! Já estava ficando
preocupada com a sua demora, quero lhe apresentar Elvira.
– Muito prazer, Elvira, como vai? Tudo bem?
– Estou bem graças a Deus, agora aqui perto de vocês,
estou bem melhor.
Raquel pediu licença a Elvira, pois queria conversar
com Cíntia a sós. Então as duas foram para o quarto de
Cíntia, e chegando lá Raquel disse:
– Cíntia, você sabe tudo o que nós passamos para
ficar com Rebeca, mas o que nós sempre temíamos que
pudesse acontecer, hoje aconteceu.
– Como assim, mãe, não estou entendendo.
– Essa moça que você viu agora na sala é a mãe de
Rebeca, veio para nos pedir ajuda e agora não sei o que
dizer. Disse a ela que aguardasse você chegar, para juntas
tomarmos uma decisão.
– E agora? Não sei o que dizer, a senhora tem noção
de que podemos ficar sem Rebeca?
– Eu tenho sim, mas se Deus assim o permitir, não
perderemos Rebeca.
Cíntia começou a chorar, sentiu o quanto amava
Rebeca, aquele ser tão pequeno e tão dependente. Mas
por outro lado não poderia ser egoísta, teria que achar
uma solução para esse problema; era o sentimento e a
razão que estavam lado a lado, teria que ser forte para
encontrar o melhor caminho.
As duas voltaram para sala, Rebeca estava dormindo
no colo de Elvira. Cíntia se sentiu muito tocada com aquela
cena, era a mãe de Rebeca que estava ali, tentando se
aproximar da filha.
Cíntia sabia, até pelo trabalho que exercia, quantas famílias
desfeitas, quantas crianças gostariam de estar perto de
seus pais, mas que por irresponsabilidade ou falta de informações
de muitos adultos estavam longe de ter uma família.
Ficaram as três mulheres ali, sem saber o que dizer.
Foi quando Cíntia tomou a iniciativa e começou a falar:
– Elvira, mamãe me falou sobre você. Realmente fiquei
muito preocupada com tudo isso que está acontecendo,
mas pensando em tudo que ela me disse, gostaria de
lhe fazer uma proposta.
– Você pode me pedir o que quiser, dona Cíntia, se
for para o bem da Rebeca eu farei. – Disse Elvira.
– Elvira, não se assuste. O que vou lhe pedir é que
tenha um pouco de paciência, com certeza encontraremos
uma solução para o bem de Rebeca.
Ficaram mais algum tempo conversando depois
Elvira foi embora. Estava feliz, pois tinha certeza de que
aquela boa mulher e a sua mãe não a deixariam ficar sem
ver sua filha.
Enfim chegou o grande dia da inauguração do
Abrigo Renascer para os pacientes que já estavam em
tratamento.
O Abrigo Renascer tinha uma cozinha ampla, lavanderia,
6 quartos com duas camas em cada um, um guarda-
roupa e uma cômoda, no total 3 banheiros, uma sala
para assistir televisão, uma área externa coberta para
atividades, onde eles poderiam fazer trabalhos artesanais,
aulas de culinária, ou qualquer outro tipo de evento.
A comoção foi geral, pois com muito esforço e dedicação
conseguiram arrecadar fundos para esta finalidade.
Várias pessoas passaram a trabalhar como voluntários;
entre elas, Vera e Thaís, que sempre apoiaram o irmão
em suas decisões.
Alberto pediu a todos um minuto da sua atenção,
queria agradecer; e com suas palavras disse:
– Sinto-me honrado com a presença de todos neste
momento. Primeiramente, gostaria de agradecer a Deus por
tantas graças alcançadas e depois agradeço a todos vocês,
pois cada cantinho deste lugar, tem um pouco de todos.
Agradeço de coração, até porque o que ontem era só um
sonho hoje tornou-se realidade. A participação de vocês foi
a principal razão de tudo isso estar acontecendo. Agradeço
também em especial à minha amiga Cíntia que sempre está
presente me ajudando e me incentivando cada vez mais.
Todos aplaudiram, e ficaram comovidos com as palavras
de Alberto.
Depois da inauguração, todos se despediram. Cíntia e
Alberto ficaram ainda conversando um pouco, queriam acertar
os detalhes do primeiro dia de trabalho naquele local.
No total eram 5 pacientes que necessitavam deste tipo
de serviço, mas Alberto e Cíntia sabiam que isso seria só o
começo de uma longa jornada.
Os dois estavam muito envolvidos com a vida daquelas
pessoas.
Quando conheceram Nely, uma mulher de 45 anos,
ficaram impressionados com sua postura diante da vida.
Era uma pessoa amargurada, não se conformava com a
doença e seu estado de saúde estava cada dia mais grave.
Alberto sabia que o estado emocional nesses casos,
influenciava muito na recuperação, mas que não se devia
nunca perder as esperanças.
E, aos poucos, Alberto e Cíntia conseguiram fazer
com que Nely encarasse a doença de outra forma, fizesse o
tratamento, lutasse pela vida e recuperasse sua autoestima.
Nely passou a fazer parte do grupo de apoio. Outros
pacientes também conseguiram o apoio de que tanto precisavam,
mas Nely era uma mulher especial naquele lugar,
era o tipo de pessoa que cativava a todos.
Já Cristina, moça jovem, abandonada pelos pais muito
cedo, se viu sozinha pelas ruas; estava com 20 anos quando
descobriu que estava com câncer de mama.
Houve uma comoção geral da equipe, pois todos a
conheciam, ela estava sempre nas redondezas, dormia
embaixo de um viaduto, próximo ao hospital.
Cristina ficou morando no Abrigo Renascer, continuou
fazendo o tratamento, mas, devido seu estado não
apresentar melhora e a doença já estar em estado bem avançado,
não teve como salvá-la e Cristina partiu, deixando
uma grande saudade.
Todos sentiram muito sua falta, mas tiveram que
aprender a conviver com a perda, e aceitar que não temos
o controle de tudo.
Alberto ficou muito chateado com a notícia, pois sentia
como se cada pessoa daquele lugar fizesse parte de sua
família. Voltando para casa, sentiu uma tristeza imensa, uma
dor que não queria calar e suas lágrimas rolaram livremente.
Quando chegou, encontrou sua irmã Vera; ela já o estava
esperando, então foi logo dizendo:
– Alberto, precisamos conversar. Estou muito preocupada.
Thaís anda muito quieta, não se abre com ninguém,
acho que está com algum problema e não quer falar.
– Mas o que acha que pode ter acontecido com Thaís?
– Não sei, ultimamente a vejo pelos cantos, sempre
chorando, não sei mais o que pensar, ela se recusa a conversar
comigo.
– Tudo bem, vou conversar com ela, ver o que consigo
fazer para que ela fale o que está sentindo.
Já era tarde da noite quando Thaís chegou, e foi logo
se trancando no quarto, não queria falar com ninguém.
Alberto foi até seu quarto e bateu na porta, pediu
para entrar. Thaís abriu a porta e foi se sentar na cama;
então Alberto sentou-se ao seu lado e disse:
– Thaís, meu bem, como você está? Você sabe nessa
correria, trabalho sede e agora a creche também, quase
não tenho encontrado tempo para vocês, mas eu me preocupo
muito, pode ter certeza disso.
Thaís ficou olhando para o irmão, abraçou-o, sentiu
naquele momento quanta fazia falta seu pai, a saudade
das conversas e brincadeiras que sempre tiveram, pois
além de pai, ela via nele um grande amigo, e agora não o
tinha mais. Mas não queria preocupar ninguém, então
se fechou em seu mundo, tinha receio que sua mãe tivesse
uma recaída.
– Alberto, estou com muitas saudades de papai, meu
coração chega doer.
– Eu sei, minha irmã, eu também sinto muito a falta
dele, mas temos que nos conformar, pedir a Deus que nos
dê forças para superarmos a falta que ele tem feito em nossas
vidas. – continuou Alberto – Você é muito jovem, com
o tempo vai entender que todos nós um dia teremos que
partir, pense em papai como alguém que teve que fazer
uma viagem e que um dia iremos reencontrar.
Thaís ficou mais calma, abraçou o irmão agradeceu
pelas palavras de conforto e deu um beijo de boa noite.
* * *
Estava uma manhã ensolarada, dava gosto de se ver.
Com a graça de Deus, tudo estava correndo bem no abrigo,
tinham algumas dificuldades, pois dependiam de doações,
mas aos poucos, contornavam todos os problemas.
Também recebiam uma verba do governo e a prefeitura
havia cedido alguns funcionários para trabalharem naquele
local, e ajudarem no que fosse preciso, tanto na parte ad23
Maria Aparecida Araujo (Mora Alves)
ministrativa como na área médica e de enfermagem, já que
alguns pacientes necessitavam de um algum tipo de acompanhamento
especial.
Nely, depois do tratamento, já totalmente recuperada,
passou a trabalhar lá também. Como não tinha família,
continuou morando ali e ainda recebia um salário pelos
serviços prestados.
A cada dia aumentava o número de pessoas que procuravam
ajuda naquele lugar, o espaço já estava ficando
pequeno para tantas pessoas. Não eram apenas os pacientes
sem uma família que precisavam de apoio, eram também
os pacientes dos pacientes que não tinham condições
de arcar com as despesas para o tratamento, pois vinham
de longe, até de outras cidades.
Aos poucos conseguiram aumentar o espaço, e
mais pessoas se sensibilizaram com aquela situação e quiseram
ajudar.
Capítulo 4
Entre os voluntários, apareceu uma moça, muito bonita
por sinal. Ela ia trabalhar dois dias da semana.
Quando Valquíria conheceu Alberto ficou impressionada.
Um homem tão bonito e só tinha olhar para Cíntia,
todo mundo percebia que ele era apaixonado por ela.
Então Valquíria decidiu que iria conquistar Alberto,
custasse o que custasse. Valquíria era muito bonita, tinha
olhos azuis, pele clara, era uma mulher que não passava sem
ser notada por todos. Ela sabia do seu poder de sedução, e
usaria isso para conquistar Alberto.
Como aos sábados Alberto ficava trabalhando no
Abrigo Renascer, Valquíria passou a trabalhar também
nesse dia, só para ficar perto dele.
Quando ia para lá, fazia questão de usar trajes provocantes,
roupas que mostrassem seu corpo escultural.
Alberto a tratava bem, e, é claro, também se sentiu atraído
por Valquíria. Amava Cíntia, mas não tinha certeza se algum
dia esta o olharia como um homem apaixonado.
Todos os sábados ficavam o dia inteiro juntos, almoçavam
juntos e Valquíria cada vez mais foi se tornando íntima
de Alberto. Então certa tarde convidou-o para saírem
depois que terminassem o serviço. Valquíria disse:
– Por que não vamos hoje à noite, sair um pouco?
Poderíamos ir a um lugarzinho mais tranquilo, tomar alguma
bebida, relaxar um pouco.
– Puxa, Valquíria, adoraria, estou precisando mesmo,
então vamos combinar o horário, aí eu passo na sua casa.
– Que tal às oito horas?
– Pra mim está ótimo!
Alberto ficou animado com a ideia, afinal, era uma
mulher tentadora.
Conforme o combinado, Alberto passou na casa de
Valquíria. Quando a viu, levou o maior susto!Ela estava
linda, seus olhos azuis pareciam duas pedras preciosas, que
o enfeitiçavam. Por alguns segundos perdeu o fôlego, mas
tomou coragem e disse à Valquíria:
– Meu Deus, como você está linda! Será um prazer
estar em sua companhia nesta noite.
– Para mim também, Alberto!
Foram a um barzinho, ficaram conversando, rindo e
se divertiram bastante, mas como já estava ficando muito
tarde, foram embora. Alberto ainda teria que passar na
casa dela para deixá-la.
Ao chegarem na frente do portão da casa dela, ele
estacionou o carro e ficou olhando para Valquíria, encantado
com a sua beleza, e então ela não se controlou: agarrou
Alberto e lhe deu um beijo na boca. Não conseguiu
controlar seus impulsos, queria muito sentir a boca de
Alberto, sentir o seu corpo encostado ao dele.
Alberto também não se conteve e correspondeu seu
beijo com um desejo incontrolável. Para Valquíria era só
um momento de entrega, já que não queria nenhum compromisso
com ele.
Valquíria não sabia, mas estava deixando de lado tantos
valores. Apesar de ser uma moça muito bonita e fazer
um trabalho tão dignificante no Abrigo Renascer, não percebia
que precisava mudar alguns de seus conceitos, como
se valorizar mais, e não deixar de lado as coisas mais simples
da vida.
Ela fora criada para ser uma princesa, vinha de uma
família que valorizava demais a beleza exterior, o status, o
dinheiro e a fama. Então Valquíria fazia de seu desejo uma
ordem, ninguém poderia contrariá-la. Estudou nas melhores
escolas, viajou para vários lugares, mas já estava cansada
dessa vida sem graça, sem alguma coisa verdadeiramente
útil para preencher o vazio.
Certo dia, conversando com uma senhora na fila do
supermercado, sentiu naquela mulher, uma mulher bem
simples, uma energia muito boa, e resolveu se abrir com
ela. Então perguntou seu nome:
– Meu nome é Nely, trabalho e moro aqui próximo, é
um local onde abrigam pessoas carentes financeiramente e
que necessitam de tratamento médico. Por que qualquer dia
não vai lá fazer uma visita? A senhora vai gostar muito.
– Ah, sim! Pode deixar o endereço comigo; quando
der, passo lá, para conhecer. – disse Valquíria, mas no seu
íntimo pensou: “Não é isso que eu quero, já tenho problemas
demais, não quero me envolver com problemas que
não são meus”.
– Está bem, a hora que quiser. Aqui está o endereço,
apareça!
Valquíria voltou para casa, guardou as compras na
geladeira e foi para o seu quarto. Ficou um bom tempo
refletindo sobre tudo o que aquela mulher havia dito.
Como seria mudar de vida, rever alguns valores, se
aproximar mais das pessoas carentes, sair daquela vida fútil?
Então, uma semana depois, decidiu fazer uma visita
no Abrigo Renascer. Entrou meio desconfiada, procurou
por Nely, mas estava ainda meio sem jeito... mas já estava lá
e queria ver no que iria dar.
Nely chegou com seu sorriso agradável, foi logo abraçando
Valquíria e disse carinhosamente:
– Que bom que você veio, achei até que não viesse,
mas você veio! Fico muito feliz!
– Dona Nely como vai? Tudo bem com a senhora?
– Tudo ótimo, minha filha, temos tudo para agradecer
nesta vida. Às vezes não valorizamos o que temos e acabamos
perdendo grandes oportunidades de sermos mais felizes.
– É verdade.
– Hoje é sábado, você vai conhecer o nosso fundador
do abrigo, você vai gostar muito dele e de dona Cíntia,
mas só que ela não vem aos sábados, somente seu
Alberto. Então vamos, quero mostrar cada cantinho deste
lugar e as pessoas que moram aqui.
Nely deu toda atenção à moça; sem perceber, fez com
que Valquíria notasse como ela era importante – um simples
gesto sem pedir nada em troca, podia fazer uma grande
diferença na vida das pessoas.
Elas nem perceberam, mas já era quase hora do almoço.
Foi quando Alberto chegou, e Nely apresentou Valquíria:
– Muito prazer em conhecê-la. – disse Alberto.
De imediato, Valquíria sentiu uma atração por
Alberto, ficou admirada com sua beleza.
– O prazer é meu, hoje vim aqui para conhecer
melhor o Abrigo Renascer e realmente fiquei muito impressionada
com o trabalho de vocês, estão de parabéns!
Gostaria muito de dedicar um dia da semana ou dois para
ajudar no que for preciso.
– Nossa! Você não sabe a ajuda que nos daria, se viesse
mesmo trabalhar conosco.
Então ficou combinado de Valquíria ir dois dias da
semana. Depois de um mês trabalhando lá, já sabendo das
histórias que Nely contava a respeito de Cíntia e Alberto,
Valquíria decidiu que iria conquistá-lo e foi assim que conseguiu
se aproximar do rapaz.
Mas depois do dia em que saíram juntos, Alberto
ficou sem graça, pois ainda amava muito Cíntia.
Já Valquíria fez questão de contar a todos que saíra
com Alberto e logo Cíntia ficou sabendo, foi Nely quem
abriu seus olhos:
– Cíntia, nós nos conhecemos há bastante tempo.
Sei do seu amor secreto por Alberto, sei também o quanto
ele gosta de você, por que vocês não decidem isso logo?
– É verdade, eu amo muito Alberto, mas nunca tive
a certeza do seu amor por mim, agora com essa notícia,
fico com mais receio ainda de falar dos meus sentimentos.
Vou pedir um afastamento no hospital, preciso de um tempo
só para mim. – continuou Cíntia – Também, como você
sabe, estou com alguns problemas em casa, ainda não sei o
que vou fazer. A mãe de Rebeca apareceu e agora estou
num dilema, ainda não sei qual melhor caminho a seguir.
Depois de uma semana, Cíntia já estava de licença
no hospital, mas antes de ir embora, naquele dia foi se despedir
de Alberto. Ele a abraçou e disse:
– Minha amiga, você não sabe a falta que vai fazer,
longe de você, não sou mais eu. Você é uma parte de mim.
– O que é isso, Alberto, você saberá viver longe de
mim muito bem e também tem a Valquíria para te fazer
companhia aos sábados.
– Valquíria é só uma amiga e você sabe disso, é bem
diferente do que eu sinto por você. Para mim você é uma
pessoa muito especial, nada nem ninguém substituirá sua
presença.
– Mas o melhor agora é eu me afastar por um tempo.
Você sabe, tenho outras coisas para resolver também.
– Tudo bem, eu entendo. – Alberto falou aquelas
palavras, mas seu coração estava partido. Respeitou a decisão
dela e mais uma vez se calou.
Cíntia saiu da sala, sentiu uma vontade enorme de
chorar, voltar e dizer a Alberto o quanto o amava, mas preferiu
se calar.
Raquel já esperava por Cíntia para, irem à casa de
Elvira, pois já tinham encontrado a melhor solução para
aquela situação.
– Mamãe, acha que estaremos tomando a decisão
mais certa?
– Claro que sim, minha filha, olha, tenho certeza de
que Elvira vai ficar muito feliz com a nossa decisão.
Elvira morava num bairro próximo a casa delas, pegaram
o carro e foram as três, direto para lá. Estava um dia
chuvoso, nenhuma das duas mulheres queriam falar o que
estavam sentindo.
Chegando à casa de Elvira, que era uma casa muito
simples. Não havia nenhum conforto, só tinha um colchão,
uma mesa e um fogão bem antigo.
Cíntia se comoveu ao ver aquele cenário, mas preferiu
não comentar, e já foi direto ao assunto:
– Elvira, estamos aqui hoje porque já temos uma solução
para os nossos problemas. Não sei se você vai aceitar,
mas acho que assim será melhor para todas.
– Pode falar, o que vocês decidirem eu aceito, como
você vê, não tenho muita escolha. Quando fui embora e deixei
a menina, pensava que iria conseguir arrumar um bom
emprego, voltar e pedir para ficar com ela, mas nada disso
aconteceu, então decidi voltar com a cara e a coragem.
Então Raquel começou a falar:
– Gostaríamos muito que você fosse morar conosco.
Temos um quarto a mais em nossa casa e você poderia ficar
morando lá, assim você ficaria mais perto de Rebeca. Não se
preocupe, nós te daremos todo apoio que você precisar, ajudaremos
você a ter um futuro melhor, voltar a estudar, pois
você é muito jovem. Pode muito bem se reerguer; há muitas
pessoas que a única coisa que precisam é de alguém que
as façam acreditar que podem mudar de vida, basta querer.
Cíntia continuou:
– E, como você vê, minha mãe já está de idade, você
poderia fazer companhia para ela, ajudar nos afazeres da
casa, ainda voltar a estudar. Por algum tempo vou me ausentar,
gostaria muito que você aceitasse.
Elvira ficou muito feliz com a notícia, beijou Cíntia e
Raquel várias vezes, nunca ninguém em toda sua vida havia
dado tanto apoio a ela, como as duas estavam fazendo.
Um mês depois Cíntia viajou, não avisou Alberto.
Simplesmente viajou.
Foi para uma pousada bem de frente à praia. O lugar
era lindo, a pousada era magnífica, de frente para o mar. Da
janela do seu quarto, dava para ver toda praia, aquela água
verde, o contraste com a areia, as pedras e as montanhas, e
tudo indicava que Cíntia teria quinze dias bem tranquilos,
daria para pensar, e decidir o que realmente queria da vida.
Quando chegou à pousada já era de madrugada, e
apenas se jogou na cama e dormiu.
Ao acordar, abriu a janela e deu de cara com aquele
cenário lindo; por um momento se lembrou de Alberto.
Como queria que as coisas entre eles tivessem sido diferente.
Tomou seu banho demorado e saiu para passear pela
praia. Depois de algum tempo, ficou ali sentada nas pedras
olhando as ondas baterem.
À tarde saiu para passear. Conheceu a feirinha de
artesanato, almoçou por ali e aquele dia passou muito rápido;
resolveu que não sairia à noite e foi dormir cedo.
No outro dia fez a mesma coisa de manhã, tomou
seu banho e saiu para passear na praia, foi quando apareceu
um homem. Estava sozinho e sentou-se ao seu lado,
um pouco distante. Ficou ali não disse uma só palavra, apenas
ficou contemplando aquele mar.
Era um homem muito atraente, alto, 1,79 m de altura
aproximadamente, moreno, cabelos pretos. Rafael era o
seu nome. Ele resolvera dar uma volta na praia, pois estava
um tanto chateado, precisava pensar em toda sua vida e
escolheu justamente aquele lugar para refletir.
Quando chegou, percebeu que já havia uma moça
ali sentada. Meio sem graça continuou ali, contemplando
o mar, ouvindo o barulho das ondas, aquele céu de brigadeiro...
quanta paz havia naquele lugar!
Foi quando Cíntia não se conteve e perguntou a Rafael:
– Você mora aqui, neste paraíso?
– Não, estou a passeio, nossa, esse lugar é mesmo
um paraíso!
– A natureza tem um poder enorme sobre as pessoas,
consegue fazer com que as elas passem a olhar mais para
seu interior e buscar seu equilíbrio.
– Também penso a mesma coisa, por isso escolhi este
lugar, era isso que eu estava precisando. Mas qual o seu nome?
– Cíntia e você?
– Rafael. Pretendo ficar aqui pelo menos uns quinze
dias, esquecer todos os problemas e só descansar.
– Eu também, você já conhece os pontos turísticos
da cidade?
– Ainda não, mas quando chegar à pousada vou me
informar sobre isso.
– Pelo que vi no roteiro de viagem, tem vários lugares
maravilhosos para se conhecer.
– E com certeza vou fazer. E você?
– Claro que sim, estou aqui para me distrair, chega
de trabalho e preocupações.
Rafael e Cíntia ficaram um bom tempo conversando,
até que resolveram voltar para pousada, e qual não foi a surpresa,
quando descobriram que estavam na mesma pousada.
Cíntia foi para seu quarto, pegou um livro para ler,
mas não conseguiu ler nem a primeira página. Então pensou:
“A história até que é interessante, mas com um dia tão
lindo lá fora, não vou ficar aqui sozinha; se ficar, vou acabar
triste novamente.”
Cíntia saiu, fez amizade com um grupo de jovens que
estavam em volta da piscina – ainda bem que ela não tinha
dificuldades para fazer amizades – observou que Rafael estava
lá também, estava bem próximo daquele grupo, lendo um
livro. Ele viu quando Cíntia chegou, e ficou admirado com
sua beleza. Achou seus cabelos lindos, com um brilho tão intenso
e o sorriso dela também, não tinha como não reparar.
Então a moça percebeu que Rafael a olhava, ficou
sem graça, mas até que gostou. Há quanto tempo só tinha
olhos para Alberto, que nunca demonstrou nenhum
interesse por ela. Sentia que Alberto só queria sua amizade
e agora tinha Valquíria – era Valquíria que ele via como
uma mulher, não ela.
Rafael se aproximou, começaram a conversar, falar do
que gostavam, seus ideais e, por fim, combinaram que iriam
sair juntos mais tarde. Iriam a um cantina próximo dali, uma
cantina de frente para o mar, que tinha até música ao vivo.
Cíntia, mais tarde, voltou para seu quarto, escolheu a
melhor roupa, ficou linda para sair, encontrou com Rafael
na recepção e saíram. Era bem perto dali, dava para ir a pé.
Quando lá chegaram, as pessoas que frequentavam
aquele lugar, já estavam bem animadas, num clima
descontraído.
Foi então que Rafael perguntou a Cíntia:
– Cíntia, você é uma moça tão bonita, não tem
namorado?
– Não, não tenho, mas gosto do meu melhor amigo.
– Não acredito! Você gosta do seu melhor amigo?
– Sim, é verdade, sou apaixonada por ele e você tem
namorada?
– Eu tive alguém muito especial em minha vida, mas
agora não estamos mais juntos. Descobri que só eu acreditava
que era para sempre, mera ilusão. Por isso decidi vir para
esse lugar, queria esquecer um pouco de tudo que passei. –
continuou Rafael – Se você não se importasse, gostaria de
contar um pouco da minha vida e como vim parar aqui.
– Claro que não me importo, Rafael, se você quiser
conversar comigo sobre sua vida, não me importo em ouvi-lo.
Rafael começou a contar sua história, contou que
era um rapaz muito novo quando perdeu a mãe, fora criado
pela tia, irmã da sua mãe, ela se chamava Rose. Nunca
soube quem era seu pai, pois sua mãe não gostava de falar
sobre o assunto.
Quando Rafael foi morar com Rose, estava com dez
anos, sua tia era uma mulher muito jovem, não tinha filhos,
então acreditava que tudo tinha o tempo certo para
acontecer. Sempre morou sozinha, agora tinha Rafael, o
filho que nunca pode ter.
Rafael, aos poucos, foi superando a falta da mãe, Rose
fazia de tudo para vê-lo feliz. Quando estava com dezoito
anos, entrou na faculdade, fez jornalismo. Era um ótimo
profissional, gostava demais da profissão.
Foi na época da faculdade que conheceu Vivian, uma
moça de personalidade forte; tinha um gênio incontrolável,
sempre fazia o que tinha vontade. Rafael se apaixonou por
Vivian muito rapidamente.
O tempo foi passando e os dois estavam sempre juntos.
Quando Rafael foi fazer estágio de jornalismo, convidou
Vivian para fazerem juntos.
Só que Vivian era muito ambiciosa, fazia de tudo para
ter mais prestígio que Rafael. Aos poucos ela estava controlando
o trabalho de Rafael, a sua vida e ele nem percebia.
Acreditava cegamente na mulher que amava e mesmo contrariando
a tia resolveu que iria morar com Vivian. Sua tia
sempre o alertava sobre o comportamento de Vivian, mas
ele não queria ouvir, pois estava apaixonado.
Mas qual não foi a surpresa, quando foram morar juntos...
Vivian fazia questão de humilhá-lo, dizia sempre que sua
carreira não iria longe, estava sempre competindo com ele.
Mesmo depois de estarem juntos, continuaram trabalhando
na mesma empresa, até que um dia ele percebeu
algo estranho: suas matérias eram sempre boicotadas,
e a pressão começou a aumentar em cima dele. Exigiam
que ele acompanhasse o ritmo de Vivian, mas o que ele
não sabia, era que Vivian sempre dava um jeito das matérias
dele não serem publicadas. Um belo dia Rafael acabou
descobrindo tudo, e neste dia ele não se controlou. Ao chegar
em casa já foi logo falando com Vivian:
– Precisamos ter uma conversa, Vivian. Sempre fui
um capacho de suas vontades, sempre fiz tudo ao seu modo,
para ver se você me notava como um homem apaixonado,
mas você passou dos limites.
– Não estou te entendendo, Rafael, o que você está
querendo dizer com isso?
– Eu descobri as suas jogadas sujas na empresa. Você
passou por cima de tudo, inclusive do meu amor por você
para se promover. Eu não consigo acreditar que tenha sido
capaz de me usar para conseguir alcançar os seus objetivos.
– Se você quer saber, usei você. Abusei da sua bondade,
sua pose de rapaz certinho, para conseguir atingir meus
objetivos e agora quem não te quer mais sou eu. Espero que
entenda de uma vez por todas, eu não te suporto mais. Não
suporto essa sua mania de querer me ajudar, me proteger.
– Você não pode estar falando a verdade, e o amor
que dizia sentir por mim? Nossas juras de amor, tudo o que
você me dizia, era mentira?
– Sim, sempre foi.
Naquele momento, Rafael saiu desnorteado de casa,
parecia que sua cabeça ia explodir; ficou imaginando como
pôde confiar tanto em Vivian? Acreditar que teria uma
família com ela?
Estava decidido, teria que tomar outro rumo em sua
vida. Não podia mais se anular em função de Vivian, deixou
de ter sua própria identidade para se entregar a uma
pessoa que não o valorizava. Bem que sua tia sempre o
alertou, agora compreendia o que ela queria dizer.
Foi para casa da tia, mas não contou nada; só disse
que precisava esfriar a cabeça e que iria dormir por lá. Rose
nem perguntou o que havia acontecido, deixou que ele
fosse para o quarto dormir.
No outro dia, bem cedo, levantou-se. Não fez nenhum
barulho, não queria acordar a tia. Passou na empresa,
Vivian ainda não estava lá, fez o acerto de contas e partiu,
sem rumo. Viajou mais de três horas, até uma cidadezinha.
Já havia decidido: iria começar uma nova vida. Devido
à sua experiência, logo arrumaria outro emprego, sabia
que não seria fácil, pois ainda amava Vivian, então prometeu
para ele mesmo: “nunca mais quero saber notícias
de Vivian.” Reconstruiu sua vida, fez novas amizades e o
novo emprego logo apareceu.
E assim se passaram dois anos. No lugar onde morava
ninguém mais ouviu falar de Rafael, nem mesmo sua
tia. Depois de certo tempo ficou sabendo que a tia havia
falecido; infelizmente só bem depois e Rafael se culpou
muito por não ter comunicado que estava indo embora.
Agora era ele e Deus. Em seguida foi trabalhar numa
empresa muito conceituada daquela cidade. Até que um
dia soube que Vivian havia se casado com o dono da empresa
onde ele estava trabalhando e quando ela descobriu
fez questão que fosse demitido.
E assim Rafael acabou indo viajar, pois precisava pensar
no iria fazer dali para frente.
– Nossa, Rafael, e eu que achei que tinha problemas.
– É, minha amiga, não é fácil.
– Bom, mas enfim, com tudo que você passou, tenho
certeza de que conseguirá encontrar o melhor caminho
para sua vida.
– Cíntia, sinceramente espero que sim, é difícil entender
o porquê de muitas coisas, mas muitas vezes acabamos
escolhendo o caminho mais difícil, apesar dos sinais
indicarem que aquela escolha não é a melhor.
Cíntia e Rafael passaram a conversar todos os dias.
Ele aproveitou para desabafar nestes dias, acabaram se tornando
grandes amigos. No último dia na pousada, Rafael
disse à Cíntia:
– Bom, Cíntia, quero que saiba que estou realmente
muito feliz por ter encontrado você, uma pessoa tão bacana
que me ajudou muito, me fez enxergar coisas que não
estava conseguindo ver.
– Rafael, os amigos são para essas coisas. Sempre que
precisar de uma amiga, saiba que pode contar comigo.
Enfim chegou o último dia, deixaram telefone para
contato e cada um seguiu seu caminho. Os dois na esperança
de um futuro melhor.
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